Raphael Machado
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Um dos nossos muitos problemas atuais é que mesmo quando somos "nacionalistas" ainda tendemos a pensar apenas em termos de "quantidade", quase nunca em termos de "qualidade".

Explico: quer-se "aumentar o poder" do Brasil, mas não sabe para quê, e não raro se confunde isso inclusive com imperialismo.

Quer-se "desenvolver a economia", mas acredita-se no crescimento pelo crescimento, sem qualquer fim ou direção específica; inclusive colocando o crescimento acima de preocupações espirituais, culturais, morais e ambientais, as quais poderiam ser negativamente afetadas pelo pensamento cancerígeno do "crescimento pelo crescimento".

Quer-se que a nossa "cultura" seja "influente" e projete "soft power", mas evitamos julgar o conteúdo dessa "cultura", nos esquivando de condenar o "feio", o "vil", o "medíocre", quando ele é "nacional".

Acaba dando na mesma Villa-Lobos e Randandandan, porque é tudo "brasileiro". Chiquinha Gonzaga e Anitta pertencem à mesma categoria, porque o "ser brasileiro", aí, seria mais importante do que a distinção entre o "belo" e o "grotesco".

Essa lógica do "poder pelo poder", do "crescimento pelo crescimento", do "desenvolvimento cego", do "igualitarismo nacional", expressa a natureza titânica desse nacionalismo - uma natureza que comumente se expressou nos nacionalismos modernos ao longo dos séculos XIX e XX.

Ele se opõe a uma perspectiva olímpica em que forma e conteúdo se fundem na justa medida, sem ultrapassar os limites. E onde todas as coisas (poder, crescimento, cultura, etc.) estão voltadas para o Bem (o que significa, também, para o belo e o justo).

Falta, nesse sentido, o "filosofar com o martelo" que se lance impiedosamente sobre o próprio Brasil, para separar "joio e trigo" em cada aspecto da nossa comunidade, inclusive sobre os homens para distinguir "população" e "povo", porque estamos aqui lidando com "o povo brasileiro", mas o "povo" não é a mera soma de indivíduos com "cidadania brasileira".

É necessário buscar a qualidade e a medida, ou seja, o caminho olímpico, abandonando o caminho titânico da quantidade e da desmesura.
Acho impressionante a ignorância do brasileiro médio sobre o Irã.

Especula-se sobre o falecimento do Presidente do Irã, Ebrahim Raisi, e do Ministro de Relações Exteriores, e como isso pode representar um "alívio para a região em relação ao extremismo islâmico".

Nos EUA, um apedeuta típico fala sobre ser uma "boa oportunidade para apoiar forças de oposição no Irã", como se o país fosse ficar "desestabilizado" de uma hora para a outra.

A impressão que se passa é que estão falando de um "acampamento nômade", uma "caravana cigana", e não da politeia mais poderosa do mundo médio-oriental, herdeira do multimilenar Império Persa, poderoso já milênios antes dos tupis chegarem à costa e séculos antes de Viriato, quando a Ibéria vivia à sombra de Tartessos.

O Presidente do Irã não é nem mesmo o homem mais poderoso do país, sendo simplesmente o executor de um plano de governo, com a soberania depositada sobre a figura do Líder Supremo, o Aiatolá Khamenei.

Apesar de que seria algo lamentável, como todos os casos do tipo, Raisi, que é um conservador moderado, seria imediatamente substituído pelo Vice-Presidente Mohamed Mokhber e haveria eleições presidenciais em 2 meses.

De qualquer maneira, o sistema iraniano de Valayat e-faqih não se apoia sobre a figura do Presidente. Ele possui instituições sólidas, funcionais e engajadas em uma permanente renovação de quadros.

Me recordo o pensamento desejoso ocidental quando da morte de Qassem Soleimani, achando que havia sido um "golpe mortal" contra a geopolítica iraniana. E hoje o Irã é ainda mais poderoso e influente. Soleimani teve seu lugar preenchido, porque o Irã é hoje uma máquina de produzir "grandes homens", como a China e a Rússia.
Analistas ocidentais e palpiteiros virtuais não entendem que Ebrahim Raisi, se morto, poderia ser sucedido suavemente por alguém ainda mais antiocidental e, de fato, belicoso (enquanto Raisi é praticamente um pacifista).

O Irã, em primeiro lugar, possui mais de 150 partidos políticos oficialmente registrados, os quais vão de formações políticas pequenas ligadas a determinadas profissões ou a interesses locais, até associações de envergadura nacional.

Todos os partidos e associações políticas iranianas, porém, se dividem em duas grandes categorias, os "principalistas" e os "reformistas", os principalistas representando a ala política conservadora, e os reformistas representando a ala política progressista.

A política iraniana é hegemonizada, porém, pelos principalistas há bastante tempo, de modo que mesmo nas vezes em que eles perderam eleições presidenciais, ainda assim mantiveram (e aumentaram gradualmente) o controle sobre as instituições mais relevantes do sistema iraniano: o Conselho dos Guardiões, a Assembleia dos Especialistas e o Conselho do Discernimento, para não falar no Parlamento.

Entre os principalistas, porém, costuma-se falar em três grandes facções.

A do Ebrahim Raisi, majoritária, é considerada a dos tradicionalistas pragmáticos.

A ala do Mahmoud Ahmadinejad, minoritária e considerada como tendo "caído em desgraça", é a ala nacional-conservadora, militarista e "neocon".

E há ainda a ala ultraconservadora, bastante forte na Guarda Revolucionária, mas não majoritária, da Frente da Estabilidade Revolucionária Islâmica, liderada por Sadegh Masouli, que defende uma postura de "zero compromisso com inimigos internos e externos", ou seja, endurecimento na política interna e externa.

E quanto aos "reformistas"? Estão praticamente excluídos das principais instituições, desde que se começou a suspeitar que muitos deles tinham vínculos com forças estrangeiras interessados na subversão do sistema iraniano. Hoje, os vários partidos reformistas juntos tem só 7% do Parlamento e número semelhante no Conselho do Discernimento (e ninguém na Assembleia dos Especialistas).

Isso significa que uma próxima liderança político-executiva do Irã, em caso de falecimento do Raisi (ou em eleições presidenciais iranianas), terá uma linha semelhante a Ebrahim Raisi, ou será ainda menos conciliador e pouco afeito ao diálogo.
Todo mundo esperava que o direitista brasileiro médio torceria pela morte do Presidente do Irã.

O conservador brasileiro é defensor das mais radicais pautas woke quando é nos países que Soros e Schwab mandaram ele odiar, as tais "autocracias".

Mas a esquerda está igual.

O direitista brasileiro se orgulha do aborto liberado e da hormonização de crianças em Israel, tomando esses fenômenos como símbolos da "civilização".

O esquerdista brasileiro hoje, por sua vez, só não quer que o Irã seja atacado pelos EUA, mas anseia por um colapso do seu governo, por ele ser "opressor das mulheres e das minorias sexuais".

O esquerdista abraça de forma total e completa o imperialismo dos direitos humanos, que visa impor a todos os povos a mesma tábua de valores, a mesma cartilha de princípios, e que legitima inclusive o intervencionismo armado para garantir esses valores.

O esquerdista seria contra uma intervenção armada dos EUA ou Israel no Irã, em tese, mas se fosse possível convencê-lo de que não é por petróleo ou pelo sionismo, mas pelo feminismo, pela sodomia e pela pedofilia, ele apoiaria imediatamente - ou no mínimo evitaria criticar.

Naturalmente, todo esse "humanismo" que simula preocupação com as mulheres ignora a maioria esmagadora das mulheres iranianas, que são apoiadoras do governo e as principais fiscalizadoras da preservação dos costumes (aliás, como costumam ser em todos os povos - não perguntem qual dos sexos impõe a mutilação genital feminina em certos países africanos!).

A mulher iraniana só existe quando ela retira o hijab e vira e-girl.

Para o esquerdista ocidental, o 99% das mulheres iranianas é, na melhor das hipóteses, ignorante; na pior das hipóteses, colaboracionista do próprio "algoz".

Naturalmente, nem passa pela cabeça do esquerdista dar um passo atrás e questionar se são realmente boas a condição de prostituição generalizada, comodificação permanente, degradação moral e fragilidade diante da possibilidade de estupros em que se encontra a mulher ocidental.

Menos ainda questionar a hipótese de que talvez povos diferentes possuam diferentes concepções de liberdade.
Hoje é natalício do Julius Evola, um dos filósofos mais interessantes do século XX - certamente um dos mais pungentes críticos da modernidade em todos os seus aspectos.

Em tempo, escrevi algumas coisas sobre ele, com enfoque no conceito de "Quinto Estado", vislumbrado por um Evola tardio, mas extremamente relevante para uma leitura tradicionalista-evoliana da contemporaneidade: https://novaresistencia.org/2019/12/05/raphael-machado-julius-evola-e-o-quinto-estado-contra-as-desinformacoes-dos-pseudo-evolianos-neoliberais/
Eu não sei o que o esquerdista brasileiro acha que é a "ascensão do mundo multipolar", mas ela é precisamente a construção de uma ordem na qual as mulheres iranianas poderão continuar tendo a liberdade de usar hijab e seguir as tradições de seus ancestrais, sem que alguma organização internacional ou algum país ocidental insignificante queira tascar sanções ou condenar publicamente.

De fato, a ascensão do mundo multipolar é a construção de uma ordem na qual as autoridades soberanas dos povos engajados na multipolaridade poderão suprimir e reprimir agitadores, subversivos e promotores de revoluções coloridas, enquanto os outros povos do mundo olharão para os lados, darão de ombros e, depois, darão tapinhas nas costas uns nos outros.

Definitivamente não é um mundo no qual nos uniremos para "fundir a humanidade em um só coração", ou no qual poderemos tentar padronizar as crenças, valores, costumes e normas ao redor do mundo. A multipolaridade não é a ascensão de uma gororoba espiritualista "new age", resultado da síntese entre todas as religiões, mas o retorno das religiões tradicionais como eixos de sustentação dos Estados.

O sentido da multipolaridade não é transformar os pastores afegãos em executivos de Wall Street que vão no Starbucks na happy hour da sexta-feira, tampouco transformar donzelas etíopes em "putinhas aborteiras" raivosas pós-gênero que se sustentam de OnlyFans.

Entendam: não é a dissolução de fronteiras e a diluição dos povos em um caldeirão igualitário mundial, mas o erguimento de muralhas ciclópicas, faraônicas, titânicas entre as civilizações, para que cada uma possa ser si mesma - mas, naturalmente, com pontes erguidas entre as muralhas, para que possa haver o diálogo, o comércio, a busca pelo conhecimento, tudo com base não na "transformação de si mesmo no outro, cuja consequência é que ninguém é mais qualquer 'povo' definido", mas no "reconhecimento do outro como outro, que tem como consequência a preferência de si mesmo".

É bom que o esquerdista "anti-imperialista" brasileiro entenda isso de uma vez, para que ele supere logo a dissonância cognitiva, e vá de uma vez para o lado do Ocidente atlantista ou, então, se posicione contra o mundialismo turbocapitalista, abandonando esses cacoetes progressistas estúpidos.
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Estive hoje no Canal 3 do Irã para comentar sobre o falecimento de Ebrahim Raisi, as reações internacionais e a importância das alianças costuradas pelo falecido presidente iraniano.
Ebrahim Raisi: Retrato de um Herói

Morto, aos 63 anos, em circunstâncias misteriosas após o a queda do seu helicóptero, Ebrahim Raisi viveu uma vida dedicada à Revolução Iraniana e ao seu aprofundamento. Com apenas 19 anos durante os eventos da queda da tirania Pahlavi, Raisi logo tornou-se procurador, função na qual ele atuou como o martelo zeloso da justiça revolucionária.

Em 1988, após 7 anos de atentados terroristas incessantes por parte da organização terrorista neomarxista "Mujahideens do Povo" (a qual participou na queda da tirania Pahlavi, mas logo traiu a Revolução querendo o poder apenas para si e boicotando a nova Constituição), que assassinou um presidente, um primeiro-ministro, alguns deputados, ministros e vários outros cidadãos, Raisi teria sido nomeado, aos 28 anos, para participar de um "Comitê" responsável por liquidar, fazendo uso de poderes excepcionais, os membros da organização subversiva em questão e seus colaboradores.

Assim, Raisi teria ajudado a livrar o Irã de alguns milhares de terroristas e subversivos, colaborando para garantir a segurança, a estabilidade e a desocidentalização do seu país.

Depois, ao longo dos anos 90, Raisi foi ascendendo na hierarquia do país especificamente através do Judiciário, tendo ocupado cargos como Vice-Presidente da Corte Suprema e Procurador-Geral da República, se alinhando politicamente à ala principalista dos tradicionalistas, sem jamais, porém, abandonar o realismo pragmático.

Tendo se tornado Presidente do Irã em 2021, Raisi fortaleceu as posições das Forças Armadas e da Guarda Revolucionária no governo; foi o responsável por voltar a impulsionar o programa nuclear iraniano e por conduzir a economia iraniana com um enfoque em contornar as sanções; ele também fez grandes investimentos em obras de infraestrutura, no setor agrícola, na indústria militar e diversos outros. Mais importantemente, Raisi suprimiu com maestria as tentativas de desestabilizar o país por meio de revoluções coloridas.

A sua condução da política externa também foi excelente, contando com o apoio do Ministro de Relações Exteriores Hossein Amir-Abdollahian, também falecido na mesma ocasião.

Entre as suas conquistas nesse âmbito estão:

1) Integração do Irã nos BRICS;
2) Integração do Irã no Pacto de Xangai;
3) Reconstrução dos laços diplomáticos com a Arábia Saudita (com intermediação da China);
4) Aliança multinível com a Rússia, apoiando-a na operação militar especial na Ucrânia;
5) Ativação do Corredor de Transporte Internacional Norte-Sul, ligando a Rússia à Índia;
6) Aumentou a integração do Irã com o Iraque e a Síria;
7) Suporte para as forças militares do Eixo da Resistência, impulsionando o combate ao terrorismo wahabi e a Israel;
8) Iniciativas de pacificação e estabilização do Afeganistão, buscando uma parceria com o Talibã;
9) Integração do Irã na Nova Rota da Seda.

Em outras palavras, sob Raisi o Irã deu um importante salto na direção da multipolaridade, como um dos seus principais pilares - o núcleo ao redor do qual gira o Oriente Médio.

O Irã continuará em sua marcha, pois apesar da perda ser sentida pelos iranianos, o país tornou-se uma máquina de produzir grandes personalidades dotadas do dom da liderança e das virtudes clássicas.
Conservadores liberais no poder (a direita brasileira) não fazem absolutamente nada para avançar com as pautas pelas quais o povo brasileiro vota neles, ou seja, as pautas conservadoras propriamente ditas.

E isso por uns motivos bastante óbvios:

Em primeiro lugar, porque "problema resolvido" é problema que não pode ser instrumentalizado no período eleitoral. É problema que não pode ser objeto de agitação. É problema que não pode ser usado para impugnar o inimigo. Tudo que está ruim tem que continuar ruim para que possamos chegar ao poder e, depois, para que possamos permanecer no poder.

Ademais, é duvidoso se os conservadores liberais conseguiriam resolver qualquer um desses problemas mesmo que quisessem. Essas figuras políticas, de modo geral, carecem do traquejo e da técnica para negociar pautas, para transigir, para sentar com o Lula e fazer combinações mutuamente vantajosas, para usar o Centrão ao seu favor, etc.

E aí, nesse sentido, entende-se os motivos pelos quais uma boa parte do povo brasileiro sentiu a necessidade de "renovar" a elite política brasileira - mas ela tão somente colocou no lugar da "velha elite" uma nova elite imberbe de influenciadores virtuais, pornógrafos, golpistas e especuladores, os primeiros que vieram "à cabeça" na hora de voltar e também o próprio catálogo de "notáveis" dos nossos tempos.

Em segundo lugar, o problema é que esses conservadores liberais carecem do arcabouço intelectual necessário para entender o mundo contemporâneo e as pautas progressistas. Eles não sabem de onde elas vêm, tampouco qual é seu objetivo, ou mesmo quem está por trás delas.

Em geral, o liberal-conservador se posiciona diante dessas pautas com uma intuição mais ou menos "animal" de que "é ruim porque é ruim". E, de fato, essas pautas são todas negativas, mas sem o entendimento consciente de sua essência nada pode ser feito contra elas. No máximo consegue-se atacá-las na superfície, sem afetar as suas raízes.

Na prática, a Quarta Teoria Política é hoje o único construto político-filosófico que consegue articular bem o sentido dessas pautas, como elas se vinculam com outras realidades políticas, econômicas e sociais mais gerais e para onde elas estão apontando no plano global; e, portanto, por enquanto, só quem domina a "caixa de ferramentas" da Quarta Teoria Política tem conseguido se posicionar de maneira precisa sobre o mundo contemporâneo e seus fenômenos mais típicos.
Os países que mais se opõem ao globalismo hoje e que são mais odiados por George Soros:

🇷🇺Rússia;
🇮🇷 Irã;
🇨🇳 China;
🇧🇾 Belarus;
🇸🇾 Síria;
🇻🇪 Venezuela;
🇰🇵 Coreia do Norte;
🇵🇸 Palestina;
🇾🇪 Iêmen;
🇭🇺 Hungria;
🇲🇲 Myanmar;
🇮🇳 Índia;
🇧🇫 Burkina Faso;
🇲🇱 Mali;
🇳🇪 Níger;
🇨🇺 Cuba.
A Ucrânia não tem mais Presidente ou governo

O mandato presidencial de Volodymyr Zelensky como Presidente da Ucrânia terminou ontem, 20 de maio. Contrariando as expectativas de sua população e apesar do seu país não estar em guerra (não houve declaração de guerra, tampouco ruptura de relações diplomáticas ou mesmo comerciais com a Rússia), o tiranete cocainômano da Cazária cancelou as eleições ucranianas por tempo indeterminado.

Com o seu mandato tendo terminado, a realidade é que tanto Zelensky quanto a Ucrânia como um todo encontram-se em um limbo jurídico, especialmente da perspectiva do Direito Internacional. Até porque, ele tampouco reorganizou o status quo em um novo sistema político que prescinda de eleições. As eleições continuam existindo juridicamente, elas continuam sendo necessárias e obrigatórias, mas elas não foram realizadas - e ainda assim Zelensky permanece como Presidente.

Pela ciência política clássica, Zelensky é um ditador, já que o ditador é aquele que suspende a normalidade constitucional para encarnar de forma absoluta a soberania através de decisões ad hoc. O fato da Constituição Ucraniana prever a suspensão de eleições durante lei marcial não altera o fato de que ela deixou um vácuo quanto à possibilidade de extinguir as eleições por meio de prorrogações infinitas da lei marcial.

Mas essa ditadura é, especificamente, uma tirania (na ciência política ditadura e tirania não são sinônimos) porque Zelensky governa contra o povo, sequestrando cidadãos para enviá-los, sem treinamento e com poucas armas para o front, e isso enquanto adquire propriedades no exterior e faz amplo uso de drogas. Na prática, Zelensky está vivo por mera tolerância dos principais atores geopolíticos envolvidos e por ser fortemente guardado contra os grupos políticos internos.

Agora que Zelensky não tem mais mandato, porém, pode ser mais difícil garantir que Zelensky continue dotado da mesma autoridade que antes. O mandato dava a ele um certo verniz de legalidade; agora, sem o mandato, trata-se pura e simplesmente de poder bruto e armado, e o poder bruto e armado privado de legalidade e de legitimidade só dura até surgir um poder bruto mais armado.

Isso se aplica, aliás, a toda a classe político-burocrática ucraniana que se renova através das eleições. Dos ministros (e dos cargos comissionados dependentes dos ministros) até os deputados, todas as principais autoridades ucranianas deixaram de existir enquanto tais. A Ucrânia tornou-se, portanto, uma grande zona cinzenta, um buraco negro político-jurídico em que nada é "certo". O país tornou-se como o território do Estado Islâmico ou como qualquer zona controlada pelo narcotráfico, com autoridades obedecidas na medida da crença no seu monopólio da violência, e nada além.

Agora bem, interpretemos isto a partir da perspectiva russa. Os ucranianos continuarão bombardeando território constitucional russo e assassinando civis, sem que estejam amparados por qualquer Estado e por qualquer autoridade legítima. Qual seria, precisamente, a diferença entre isso e uma organização terrorista? Qual seria o impedimento para que a Rússia executasse com um ataque de drones o Cidadão Zelensky, sem cargo, mas ordenando bombardeios contra civis russos?

A única garantia é que a Rússia não negociará mais qualquer paz com Zelensky, já que ele não existe politicamente, é apenas um cidadão privado. Seria como se Assad negociasse com Al-Baghdadi na época no auge da guerra síria.

A partir da perspectiva brasileira, por sua vez, é absurdo que o Brasil siga tratando a Ucrânia como um país existente quando trata-se, hoje, apenas de um "território" baldio, privado de Estado, carente de qualquer tipo de governo e, portanto, de autoridades legítimas.

Não faz sentido nem mesmo mantermos aberta a Embaixada Ucraniana no Brasil porque um embaixador deriva a sua autoridade do Chefe de Estado e responde ao Chefe de Estado. O que é um embaixador, portanto, de um território que não tem Chefe de Estado?
O Brasil faz bem em não ir à farsa da "cúpula da paz" na Suíça, mas deveríamos ir além e dizer que "o rei está nu".

A Ucrânia não existe, não passa, a partir de hoje, de uma ficção mais irreal até que a República do Kosovo.

Quanto ao cidadão Zelensky, a ampulheta continua escorrendo e seria mais sábio da parte dele pedir asilo político na própria Rússia.
A ideia de que o "dionisíaco", elemento central do Ser do Brasil, pode ser resumido simplesmente a esbórnia, promiscuidade, orgia, sexualidade indefinida ou "transgressora" e que a nossa identidade fundamental encontramos, por exemplo, nessas manifestações tal como elas aparecem especialmente na camada lumpem de nossa população é um desvio de entendimento em relação ao significado do "dionisíaco".

Isso não significa que a dimensão do êxtase e da carnalidade não existam em Dioniso, mas ela é parte de algo mais profundo, ela é a expressão externa de um mistério interior.

Esse mistério é o da transcendência imanente, ou seja, da presença do sublime na materialidade, da encarnação do incriado no criado, do encontro entre Céu e Terra no ponto intermediário do horizonte, a manifestação da luz em meio às trevas, do movimento, do devir, da transitoriedade.

É por isso, por exemplo, que filosoficamente, Aristóteles é dionisíaco. Ele lida com o manifesto, com o que está expresso e posto enquanto tal, ou seja, com os entes em suas interações, movimentos e manifestações. Mesmo o "Ser" de Aristóteles é tão somente o "ser do ente" como aquilo que une os entes, e nada além. É o que o distingue de Platão enquanto filósofo apolíneo.

No mesmo sentido, Cristo é uma das máximas expressões do dionisíaco, como Deus-homem, absoluto-limitado, imanifesto-manifesto, eterno-histórico. E boa parte do culto cristão é dionisíaco. A Eucaristia, como ato de devorar o corpo do Deus-homem e beber o sangue do Deus-homem, é uma espiritualização da carne.

Todos os elementos da Paixão de Cristo, da tortura à descida ao inferno constituem elementos dionisíacos, tal como os elementos que aludem nos cultos cristãos, ao sofrimento e ao martírio.

Naturalmente, o elemento do "excesso" também é um outro elemento do dionisíaco, em que o erotismo e a embriaguez apontam para um esforço de libertação através do êxtase.

Mas nada disso se confunde nem com a pornificação social generalizada, tampouco com a dissolução generalizada das normas e tabus, e menos ainda com o afundamento do país na indistinção orgiástica permanente ou semipermanente.

Se o Carnaval tem uma dimensão sagrada essa dimensão está atrelada ao fato do Carnaval ter início, meio e fim, porque no final, a Luz, o Sol e a Ordem triunfam. O Carnaval permanente, ou seja, o êxtase estendido é uma pulsão de morte cibelina, em que Dioniso é castrado e torna-se escravo eunuco da Grande Mãe.

Assim, o dionisíaco brasileiro encontramos não exatamente na "Farofa da Gkay" e em fenômenos escatológicos e grotescos semelhantes (especialmente quando eles são tornados "norma", normalizados, publicizados, tornados onipresentes), ou pelo menos não principalmente nesses elementos, mas no próprio fato já posto da mestiçagem, na espiritualidade dramática e sofredora típica do brasileiro, no misticismo telúrico do sebastianismo (expresso, inclusive, em figuras como o Lula), na alternância entre excesso e penitência, na malandragem, na tolerância limitada (aceita-se muita coisa, mas não tudo), no carpe diem da preguiça, no "deixa pra lá" e no "deixa disso", e em um humor que desconhece limites, ao mesmo tempo que, também, na violência repentina e explosiva, nas relações familiares complexas e conturbadas, não raro hipócritas.

Tal como eu, antes, mencionei o Lula, poderia mencionar também o Itamar Franco, o Paulo Maluf ou o Pedro I como figuras que expressam certos aspectos do dionisíaco.

O dionisíaco, portanto, não é a abolição da moralidade pública, mas o vai-vém do pecador penitente, do homem que alterna entre ceder ao vício e buscar o ascetismo, e mesmo a coragem de todo aquele que tenta manter acesa uma chama de pureza em meio à escuridão. É o encontro entre a perfeição e a imperfeição. A conversão sincera do criminoso, o delicioso churrasco de domingo, a reconciliação entre a vítima de violência doméstica e o seu algoz/amado, o amigo abstêmio que acompanha os seus ao bar, a idosa que vira Santo Antônio de cabeça para baixo, o exu, uma roda de samba, tudo isso é dionisíaco.
O que é totalmente diferente de Anitta, de Farofa da GKay, da legislação progressista pós-moderna, dos impulsos na direção da pedofilia, da misandria, do abortismo, da extinção do "homem" e da "mulher" enquanto categorias fundamentais, da incontinência sexual permanente típico do favelismo cultural, etc.