Raphael Machado
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Resultado das Eleições Parlamentares Francesas por Partido

"Quem ganhou as eleições na França?" Analisarei os resultados amanhã, mas para fundamentar qualquer análise é necessário atentar para os resultados objetivos dos partidos em comparação com as últimas eleições.

Vejam:

🟢 Rassemblement National: 126 (82) (Aliança Nacionalista)
🟢 Renaissance: 98 (150) (Aliança Macronista)
🟢 La France Insoumise: 71 (65) (Aliança Arco-Íris)
🟢 Parti Socialiste: 64 (28) (Aliança Arco-Íris)
🟢 Les Républicains: 39 (61) (Aliança Neocon)
🟢 Mouvement Démocrate: 34 (46) (Aliança Macronista)
🟢 Europe Écologie Les Verts: 33 (15) (Aliança Arco-Íris)
🟢 Horizons: 26 (27) (Aliança Macronista)
🟢 Parti Communiste Français: 9 (12) (Aliança Arco-Íris)


Os números em negrito são os assentos conquistados hoje, os números entre parênteses eram os assentos conquistados nas últimas eleições. Isso permite entender quem cresceu e quem encolheu, bem como o QUANTO cada um cresceu ou encolheu.

Atentem que aqui estamos falando dos partidos isolados e não dos grupos eleitorais, porque as coalizões eleitorais muito provavelmente se reconfigurarão ou simplesmente desmontarão.

Só esses resultados aí já desmontam TODAS as análises que eu vi de "analistas" brasileiros até agora.

Narrativas não resistem a números.
https://www.youtube.com/watch?v=kzykosEgvqo

Por que a "frente ampla" da esquerda francesa abandonou candidaturas em várias circunscrições? Por que, não só na França, mas em vários outros lugares, a "esquerda anti-imperialista" e "anticapitalista" cerra fileiras com as forças políticas mais privatistas e oligárquicas quando os nacionalistas crescem?
Eleições Francesas: Avanço de Le Pen, Ressurreição de Hollande, Vexame de Mélenchon e Sobrevida de Macron

Se dependermos da mídia de massa ocidental para nos informarmos, acreditaremos que, na França, o "nazifascismo" foi derrotado e "a esquerda" triunfou, demonstrando todo o seu poder e apoio popular, etc.

O mundo real, porém, parece não se adequar muito às narrativas triunfalistas dos aparatos de propaganda da hegemonia.

O Reagrupamento Nacional, de Marine Le Pen e Jordan Bardella, se consolidou como o maior e mais popular partido político da França, com 126 assentos na Assembleia Nacional, um grupo parlamentar de 143 deputados e mais de 10 milhões de votos (correspondendo a 37%) no 2º turno.

Assim, o RN, que há 10 anos tinha 2 cadeiras e há 2 anos tinha 89 cadeiras, galgou uma posição na qual o partido ocupa 25% dos assentos, dependendo muito pouco de micropartidos anexos ou de alianças, como um corpo político homogêneo, apesar de ter a sua diversidade interna.

Quem fala em "derrota da 'extrema-direita'" está produzindo propaganda, e não análise; e são precisamente as pessoas que inventaram um "risco" do RN levar mais da metade dos assentos da Assembleia (tal como a propaganda ocidental inventou um "Kiev vai cair em 3 dias", pra depois falar que a Rússia "nem conseguiu tomar Kiev em 3 dias").

Na prática, o resultado do RN foi bastante confortável e satisfatório. Estão no melhor dos mundos. Um resultado avassalador talvez colocasse o RN na posição desconfortável de ocupar cargos em um governo de coabitação, fritando sua popularidade nos meandros da burocracia da "geringonça" francesa, enquanto Macron seguiria tomando as suas decisões livremente em temas de segurança nacional e política externa.

O RN agora poderá seguir fustigando o governo (melhor ainda se for um governo centro-direita-esquerda, enquanto controla 1/4 da Assembleia. 1/4 da Assembleia não basta para o RN, sozinho, bloquear qualquer projeto ou derrubar o governo, mas é suficiente para obrigar os outros partidos a levar os nacionalistas em consideração, forçando-os a adaptarem e alterarem projetos de lei para que eles possam passar.

O caso da "frente popular" da esquerda é uma história triste e patética de estelionato eleitoral. Essa "frente popular" tem como única figura razoavelmente carismática Jean-Luc Mélenchon, da França Insubmissa. Entendam: ele não era o líder da coalizão, mas não raro atuava como porta-voz por ser, como eu disse, o único carismático.

Pois bem, apesar de todo o frisson midiático, o partido de Mélenchon melhorou sua posição na Assembleia em apenas 6 assentos. É um crescimento? É claro. Mas é um tanto quanto peculiar tratar como se fosse a vitória da Copa do Mundo. Dá a impressão de ter algo mais por trás.

Fica fácil entender quando se olha com mais atenção para quem realmente cresceu nesse saco de gatos que era a tal "frente popular" (sem povo). Em paralelo: Sem povo porque, de fato, os quase 20 partidos que compunham a tal "frente" só conseguiram abocanhar 7 milhões de votos no 2º turno das eleições.

Os partidos que mais cresceram dessa "aliança antifascista" foram o PS do ex-presidente François Hollande, que quase triplicou de tamanho e o EEV, econeurótico, que dobrou de tamanho. O PS foi de 28 para 64, o EEV foi de 15 para 33. Juntos esses partidos representam 50% da tal "frente popular"...

O PS de Hollande é, hoje, o partido mais belicista, otanista e atlantista da França, ultrapassando o LR de Sarkozy desde que Macron chegou ao poder.
Já no governo Hollande, o PS apoiou a intervenção militar francesa no Mali, sob justificativa de "combater extremistas" - extremistas armados e criados pela intervenção francesa na Líbia, gerando uma situação de retroalimentação que tornou a ocupação permanente. O governo Hollande, também, fez campanha pela organização de uma expedição militar internacional contra Bashar Al-Assad, e Hollande admitiu publicamente armar os grupos terroristas curdos e salafistas que espalharram caos e destruição pelo Oriente Médio. Foi Hollande, ademais, um dos arquitetos europeus do Maidan e um dos promotores dos Acordos de Minsk como um artifício para dar tempo de militarizar a Ucrânia para preparar uma guerra, usando a Ucrânia de proxy, contra a Rússia. No plano interno, Hollande ainda passou uma reforma trabalhista draconiana e arreganhou ainda mais o país para a imigração, fazendo questão também de promover uma avalanche legislativa woke em matéria sexual e de gênero.

Hoje, o PS é o partido que é mais vociferante no apoio à Ucrânia e nos ataques à Rússia. A sua defesa do reconhecimento de um Estado palestino não passa de uma bagatela cuja finalidade é "lavar" o sionismo para lhe dar sobrevida.

O EEV não fica atrás, acusando a Rússia e a China de serem países agressivos e de espalharem "fake news", defendendo a remessa ilimitada de armas para a Ucrânia e até mesmo sanções contra a empresa estratégica francesa TotalEnergies por ter violado as sanções anti-Rússia. Para piorar, o EEV nem mesmo finge ser crítico de Israel.

Não é casual, portanto, que o programa da frente popular fala em armar a Ucrânia até os dentes e inclusive de perdoar todas as dívidas ucranianas, para dar sobrevida ao Estado-pária em questão, além de defender "mudança de regime" em Gaza - de modo que quando a "frente popular" fala em reconhecer um Estado Palestino, é uma Palestina sem Hamas e sem as outras forças de resistência. De resto, para além de posições econômicas pouco diferentes das posições da "ala esquerda" do Reagrupamento Nacional, a "aliança arco-íris" promete distribuir cidadania para imigrantes recém-chegados, e ainda inventar a categoria do "refugiado climático", para aumentar ainda mais a imigração, além de adesão total à pauta do "zero carbono".

Para os brasileiros interessa o fato de que a frente popular pretende bloquear importações de produtos agropecuários gerados com desmatamento, o que equivale a uma promessa de pressionar em cima da pauta da Amazônia em nosso país, como tem feito Macron.

Bem, Mélenchon empenhar o seu carisma e a sua reputação para esse programa, para ressuscitar a carreira arruinada de François Hollande, para eleger o extremista sionista Raphael Glucksmann (ex-assessor de Mikhail Saakashvili, agitador na Praça Maidan junto a Victoria Nuland, russófobo fanático, recentemente exposto como agente da CIA na França) e outros elementos nefastos, tudo enquanto posa de "militante antifascista" não é ingenuidade, é canalhice óbvia.

Mélenchon exerce o papel de bombeiro do sistema, de oposição controlada e isso não é surpresa. Toda vez que o nacionalismo dá uma guinada ascendente, Mélenchon é acionado para justificar o pedido de votos a Macron com apelos aos mitos do antifascismo histórico.

E foi assim que, de novo, ele foi conscientemente instrumentalizado para impedir que a vitória do RN virasse um massacre.

A "frente popular" retirou todas as suas candidaturas em circunscrições nas quais houvesse, no 2º turno, um candidato do RN disputando com um de Macron. Os macronistas fizeram o mesmo em circunstâncias análogas. É a velha estratégia do "cordão sanitário", que depende da construção de uma "histeria antifascista" pra convencer comunistas a votar em candidatos praticamente ancaps "contra o fascismo".

Assim, a coalizão arco-íris uniu seus votos à coalizão macronista em todas as circunscrições. E é isso, e apenas isso, que explica o RN não ter levado mais da metade dos assentos da Assembleia.
O problema é que era fácil fazer o cordão sanitário quando o voto em Le Pen era um voto de protesto. Hoje, o voto em Le Pen e seu partido é um voto popular, bem enraizado e dotado de organicidade e capilaridade. Como fica, aos olhos do próprio eleitorado "esquerdista", ter que apoiar o Macron eleição após eleição?

Será por isso que 6% dos filiados ao PCF (membro da "frente popular" e um grandes derrotados dessas eleições) preferiu votar no RN nessas eleições?

Quanto a Macron, que viu o núcleo de seu poder colapsar, com uma perda de 86 cadeiras de seu grupo parlamentar, engana-se quem acha que ele foi destruído. A prova disso é que não apenas não parece que vai renunciar (dizia-se que era o que faria a depender do resultado), como ainda se recusou a retirar o primeiro-ministro Gabriel Attal.

Isso significa que Macron se sente forte o suficiente para, no mínimo, adiar uma troca de governo e, com isso, talvez até prepara uma nova aliança governista. Naturalmente, como qualquer nova configuração governista terá que ser mais heterogênea, isso significa um enfraquecimento de Macron, mas não da sua linha de governo.

Uma aliança com o LR já protegeria o novo governo de um "voto de desconfiança". Melhor ainda se Macron conseguir atrair, também, o PS e o EEV. Aí Macron teria a maioria necessária para um novo governo estável, ainda que heterogêneo. Mas considerando que tanto o PS quanto o LR (sem a ala gaullista de Eric Ciotti) são neocons e atlantistas, essa heterogeneidade não é tão instável.
Não é possível levar a sério nenhuma acusação de "atrocidade" que o Ocidente periodicamente tenta jogar no colo da Rússia.

Primeiro, porque Kiev e seus apoiadores ocidentais têm cometido atrocidades diárias, desde o massacre de policiais do Berkut no Maidan, passando pelo Massacre de Odessa, até os bombardeios de civis no Donbass, até as constantes atrocidades dos últimos 2 anos.

Segundo porque inúmeras notícias falsas de atrocidades russas já foram desmascaradas, de Bucha até a "maternidade de Mariupol" (que tinha até "grávida de Taubaté").

O que nunca é esclarecido é o porquê dos batalhões ucranianos usarem escolas como bases, ou situarem depósitos de armas e peças de artilharia do lado de infraestrutura civil como hospitais.

De resto, no caso em questão em relação ao qual estão fazendo um escarcéu ridículo, foi a defesa aérea ucraniana que atingiu, por acidente, um hospital em Kiev usando o sistema NASAMS.

Ademais, mesmo que, dessa vez, tivesse sido a Rússia, permaneceria a realidade de que atacar alvos civis é parte da estratégia oficial de Kiev desde 2014, enquanto a Rússia só acerta alvos civis como dano colateral e por acidente.
Eu não quero que o mundo seja como o Brasil. E seria a pior coisa do mundo se o mundo fosse como o Brasil.

Como patriota, eu quero que apenas o Brasil seja como o Brasil e também como patriota de meu país e povo, quero que cada pátria seja precisamente aquilo que ela é, retornando à própria essência.

Para que o Brasil seja o Brasil ele deve ser único entre as nações, absolutamente distinto de todas as outras, por suas próprias raízes, história e essência. Sem a diferença não pode haver o senso de identidade, que é aquilo que nos permite reconhecer o Brasil como o Brasil e a nós mesmos como brasileiros.

Um "mundo brasileiro" representaria precisamente a morte do Brasil enquanto tal. Ora, o que vemos naqueles países que pretenderam se projetar como modelos universalistas não é exatamente o colapso e a ruína, com a perda acelerada da própria identidade original?

Essa noção do Brasil como "modelo universalista" é típica daqueles que não são realmente anti-EUA ou anti-Ocidente - ao contrário, concordam com a essência de seus projetos, mas apenas gostariam que o Brasil estivesse no lugar das potências atlantistas.

Isso aí até pode ser chamado de "nacionalismo", na medida em que um Francis Fukuyama ou um Bernard-Henri Levy podem ser considerados "nacionalistas", mas não passa pura e simplesmente de imperialismo e globalismo.

Essa é a razão pela qual eu sou um patriota multipolarista, porque esse "nacionalismo" aí, dos universalistas, é o pontapé inicial dos projetos mais nefastos, antinacionais e anti-humanos já pensados.

As elites mundiais, em suas raízes nos séculos XVIII e XIX, também começaram assim. Primeiro nacionalistas, logo imperialistas e agora globalistas.
https://www.youtube.com/watch?v=O62K0TnVjLM

A "causa palestina" é de "esquerda", certo? Será mesmo? Por que não é possível confundir a luta palestina com outras pautas militantes da esquerda ocidental e como a tentativa liberal-progressista de monopolizar a causa palestina só causa prejuízos à própria pauta palestina?
Em todo 9 de julho passa-se o mesmo: liberais de esquerda vem explicar como o 9 de julho é uma data que simboliza o racismo eurocêntrico de matriz bandeirante que faz com que São Paulo se ache melhor do que todos os outros estados.

Liberais paulistas de direita, por sua vez, vêm nos dizer que o 9 de julho foi, na verdade, uma "luta pela liberdade", associando isso, simultaneamente, a um anseio popular pelo livre-mercado e pelas pautas do Novo e de grupos semelhantes.

Separatistas nos dirão que, na verdade, o 9 de julho representava um anseio por separação de São Paulo em relação ao resto do país, e encontrarão ali indícios para legitimar os próprios sentimentos antinacionais.

Trabalhistas, por outro lado, lerão o 9 de julho como uma reação da oligarquia paulista contra o processo revolucionário iniciado por Vargas, usando a questão constitucional como narrativa legitimadora de um esforço por retornar à política da República Velha.

Há uma miríade de outras linhas interpretativas, das que vinculam a revolta de 1932 a uma expressão tardia do tenentismo, até as que consideram que tudo, na verdade, não passou de uma sequência de gafes e infortúnios sem nada muito mirabolante por trás.

O problema dos esforços por se debruçar sobre o 9 de julho, porém, são os mesmos de se debruçar sobre o 20 de setembro, no que concerne o Rio Grande do Sul, ou em relação às outras datas de revoltas locais contra o poder central ao longo da história brasileira.

É que o 9 de julho, como todas as outras datas, já foi absorvido pelo imaginário popular local como uma data simbólica que condensa ideais identitários paulistas. Ele tornou-se, portanto, um mito.

Nesse mito, o 9 de julho representa, simplesmente, o símbolo de uma coragem paulista que, mesmo em desvantagem, enfrentou forças superiores vindas de todos os lados em nome da honra e do orgulho da população local, que teria sido desprezada por autoridades incompetentes e indiferentes.

E é nesses termos que o 9 de julho é comemorado por muitos paulistas.

Há aqueles que gostariam que essa data, como as outras datas regionalistas, não fossem comemoradas de forma alguma no país. Os mais torpes e doentes inclusive questionam o "comemorar uma derrota" (porque essas pessoas, obviamente, nunca ouviram falar em honra, e não fazem a menor ideia do que é virtude).

No lugar de dar murros em ponta de faca, porém, e de dar uma de "jacobino", o que o próprio Vargas fez e o que se deve fazer é ressignificar dialeticamente essa data, como todas as outras datas de revoluções e revoltas regionalistas, em prol da construção de uma visão unitária e continuísta da história do Brasil, em que os conflitos locais se resolvem sempre para uma maior glória da pátria, e em que os inimigos se reconciliam e voltam a ser amigos.

A noção de que o paulista será "convencido" a não comemorar o 9 de julho, como a noção de que o gaúcho será convencido a não comemorar o 20 de setembro, e outros brasileiros de outras partes em relação a revoltas locais, é simplesmente irreal - e a noção de que eles devem abrir mão de seus símbolos e mitos identitários regionais para que sejam "brasileiros de verdade" não é senão fermento de separatismo.
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Eu estive na segunda-feira na OfoghTV iraniana para comentar sobre o estado atual do conflito Israel-Palestina e as possíveis repercussões das eleições francesas nessa questão.
E se, de fato, a inteligência artificial substituir os juízes brasileiros?

O Presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, recentemente, anunciou que em 2 meses estará pronto um sistema de inteligência artificial, alimentado com a legislação, a doutrina e a jurisprudência, que fará análise processual e redigirá sentenças.

A sentença produzida, naturalmente, será "revisada" pelo juiz, que então concordará ou não com a "solução" dada pela inteligência artificial. A inovação é vista como algo maximamente benéfico, ou pelo menos como uma inevitabilidade.

Em primeiro lugar, é sempre necessário criticar essa mentalidade de "ovelha" do homem dos últimos tempos em relação à tecnologia. Ele olha para as inovações tecnológicas com a esperança infantil com que certos povos olhavam para seus totens ou contemplavam fenômenos naturais raros.

Com toda inovação tecnológica ressurge esse olhar infantil, ingênuo, ruminante, de quem espera milagres e um mundo melhor. E isso mesmo apesar do fato óbvio de que as últimas décadas de "inovação" não produziram, realmente, um mundo muito melhor como um todo.

Nessas condições, não se pode mais dizer que a tecnologia é ferramenta do homem, e sim que nós não passamos do instrumento passageiro através do qual a Técnica, em si, atualiza e desenvolve a si mesma. A modernidade inaugura essa inversão, que é radicalizada pela pós-modernidade.

A mentalidade moderna, em sua fé na tecnologia, está sempre buscando o meio mais "eficiente" e menos "custoso" para fazer as mesmas coisas, acreditando que isso é um fim em si que se sobrepõe a todas as outras preocupações. Essa mentalidade, naturalmente, se encaixa bem com o modo de produção capitalista.

Para além das reflexões gerais que sempre fazemos sobre a Técnica, há algumas outras complicações.

A realidade é que, hoje, ninguém lamentaria uma substituição de juízes brasileiros por sistemas de inteligência artificial. Entre os poderes e instituições do nosso país, hoje, as vinculadas ao Judiciário são as de pior reputação entre as massas populares.

É que todos percebem como muitos dos homens de proa dessas instituições se sublevaram contra a própria essência do seu encargo, que é o de ser um burocrata técnico, ferramenta da soberania (encarnada nos poderes políticos, como o Executivo e o Legislativo), absolutamente alheio às emoções pessoais ou coletivas, ao clamor da mídia, aos anseios e preferências partidárias, etc.

O bom juiz, de fato, até poderia ser comparado a um "ciborgue" - mas apenas no sentido de sua necessária "alienação" em relação às divergências ideológicas, aos conflitos sociais, às preferências pessoais, etc. - de resto, é em sua "humanidade" que se apoia o ofício do juiz; "humanidade" entendida como a posse das faculdades racionais e noológicas singularmente humanas que permitem ao juiz dar a melhor solução possível a uma lide.

Falo aqui em "substituição dos juízes" mesmo que a pretensão seja de que o juiz tão somente seja auxiliado pela inteligência artificial, e isso por um motivo muito simples.

Todos que já trabalharam com o Judiciário sabemos que muitos juízes não leem realmente o processo e que boa parte das sentenças são construídas por técnicos, analistas e assessores. Os juízes tão somente "corrigem" (e olhe lá...) e assinam. A fé irracional do homem contemporâneo na tecnologia é garantia de que os juízes se considerarão suficientemente seguros para prestarem ainda menos atenção nos processos e na redação das sentenças.

O juiz, portanto, passa à função de "supervisor" do trabalho da inteligência artificial. E quando isso se generalizar será razoável nos questionarmos: então por que pagar salários exorbitantes aos juízes? Para que juízes?
Ninguém lamentará essa perspectiva e poucas vozes, fora da casta judicial, se levantarão em defesa dos juízes. Eu, por exemplo, seguirei insistindo na necessidade de apartar a inteligência artificial de todas as funções tradicionalmente humanas - aquelas já descritas pelos filósofos clássicos como vinculadas ao espírito humano, o que abarca de funções artesanais e artísticas à condução política, passando pelo labor pretoriano.

Desnecessário recordar sempre que longe de "neutra" a inteligência artificial já está sempre inscrita com determinados valores, os valores inscritos nela pelos programadores e pelas empresas que a desenvolveram, que obviamente não são neutras. Vimos inúmeros exemplos de IAs cujas respostas e ações revelam um viés ideológico específico.

Nesse sentido, o problema do juiz parcial será transferido para uma inteligência artificial que seguirá sendo parcial.
O Racismo de Esquerda e a Luta pela Libertação Africana

Pergunte a um esquerdista se o racismo se faz presente na mentalidade do seu campo político tanto quanto na mentalidade do campo político adversário, e ele o negará veementemente. Afinal, é apenas a direita que é racista, jamais a esquerda.

Quando um esquerdista é racista é apenas por lapso, por um equívoco, porque ele não se "desconstruiu" o suficiente e foi subitamente "dominado" pelas "estruturas invisíveis" da realidade social que o "empurraram" a ser racista (se esse tipo de narrativa parece fantasmagórica e absolutamente esquizoide é porque é mesmo - boa parte da "teoria crítica" ocidental se baseia em fantasmagorias e crenças em micro-opressões invisíveis).

Mas pergunte, logo em seguida, o que o esquerdista acha das políticas culturais dos nacionalistas africanos e dos pan-africanistas, e você imediatamente se depara com discursos tão grotescos e desumanizadores quanto os que se fazem presentes em qualquer panfleto neonazista.

Em primeiro lugar, a pretensão do esquerdista é que o "caminho natural" para um determinado povo africano é basicamente o de se integrar e adequar aos princípios, valores e normas da civilização ocidental em sua fase pós-moderna e cosmopolita, tal como "consagrados" na ideologia dos direitos humanos.

Essa é uma posição claramente racista, já que nega o valor intrínseco dos processos civilizacionais multimilenares da África, os quais se apoiam em valores, princípios, símbolos, mitos, normas e costumes que se distinguem radicalmente dessa civilização ocidental.

Os nacionalistas africanos e pan-africanistas creem que seu destino não está na fusão em um caldeirão planetário de uma aldeia global, mas na afirmação da singularidade absoluta e autossuficiente do "mundo africano". Eles não querem se ocidentalizar. Eles não veem a libertação em relação à dominação político-econômico-militar ocidental como uma "fase" em um processo de transformações liberais sucessivas.

Eles rechaçam não apenas o liberalismo econômico e as estruturas de dominação financeira, além da ocupação militar e o governo de oligarquias compradoras; eles rechaçam também o próprio modelo liberal de democracia, a ideologia dos direitos humanos, a ideologia ocidental e racista do "progresso", além de todas as pautas do wokismo, também exclusivamente ocidentais (típicas do Ocidente pós-moderno).

Mas o esquerdista ocidental não aceita isso.

Ele rejeita a ideia de pluralidade de civilizações, acreditando que existe apenas uma, a "humana", a qual caminha toda pelas mesmas fases e em uma mesma direção, um "fim da história" mais ou menos anarco-comunista e libertário, em que não haverá trabalho, tampouco hierarquias, tampouco Estado, ou religião, mas haverá abundância garantida pela tecnologia.

O esquerdista ocidental também rejeita que o nacionalismo africano e o pan-africanismo tenham valor em si, como veículos da autoafirmação identitária e civilizacional dos povos africanos. Para o esquerdista ocidental, esses elementos têm valor apenas na medida em que possam ser direcionados contra países "brancos".

O africano que expulsa tropas francesas de suas terras é bom, mas quando o mesmo africano decide implementar as pautas morais e culturais da maioria popular e dos ancestrais dessa maioria popular, ele vira um "monstro", "traidor", alguns até o tratam como "branco de pele negra" (já que na cabeça do esquerdista ocidental os africanos viviam em um estado permanente de orgia poliamorista e pós-gênero antes do imperialismo britânico - quem inventou a heterossexualidade na África foi o "homem branco"!).

A impressão que se tem é de que instintivamente o esquerdista ocidental, educado em ideologias ocidentais, menospreza o africano. Não vê nele alguém capaz ou digno de cuidar dos próprios assuntos e de construir as próprias comunidades com base nos próprios valores.
O esquerdista tem uma visão condescendente em relação aos africanos. Ele os vê de cima para baixo, como se os africanos fossem "crianças" ainda aprendendo as minúcias da civilização (a única, que é a ocidental). Ele é visto como útil até certo ponto (contra os EUA e a França), mas ai dele se "sair da linha" e decidir fazer uma África para os africanos e segundo princípios africanos.

Uma vez perguntaram, em determinado país, o porquê dos africanos estarem preferindo relações com a China e a Rússia. Disseram que a Rússia e a China constroem fábricas, ferrovias e usinas de energia na África, eles mandam engenheiros e técnicos.

O Ocidente manda advogados, ativistas sociais, ongueiros, e no lugar de desenvolvimento dá "palestrinha" de direitos humanos e lições de moral, para depois exigir obediência à cultura ocidental. Claramente, uma atitude racista.

O Ocidente, mesmo em sua versão "esquerdista", "progressista", "liberal", do século XXI ainda cultiva a mesma mentalidade racista e proselitista do século XIX em suas relações com a África, e ainda lida com o africano como "ainda-não-humano", necessitado de "educação" (a nossa, claro, que é a única certa).

A decadência acadêmica ocidental confundiu o vocábulo "racismo", de modo que tornou impossível fazer com que as pessoas percebam e entendam quando elas estão sendo racistas de verdade. Daí são racistas enquanto simultaneamente ficam delirando esquizofrenicamente sobre copos de leite.

Ainda que haja, aí, pluralidade de definições, toda hierarquização objetiva de povos, culturas ou civilizações, com uma pretensão universalista, é uma expressão de racismo. Não se trata de "preferência", "gosto" ou daquilo que cada um acha certo e verdadeiro, mas a partir do mundo em que considera-se que um povo, sendo inferior, deve se submeter a um outro povo, visto como superior, por causa de seus diferentes valores e suas diferentes maneiras de interpretar o mundo e a história, estamos diante de racismo.

É racismo achar que os africanos não devem decidir, segundo os próprios valores, sobre a própria cultura e as próprias normas. Racismo, inclusive, que deveria ser punido por lei.

Em tempo, estive com vários patriotas pan-africanistas em minha visita a Moscou para a Conferência sobre Multipolaridade. E todos eles enfatizaram como sendo uma das prioridades dos povos africanos lutar contra a ocidentalização cultural e moral de seus países.

A esquerda ocidental racista está na contramão dos anseios e pretensões dos povos da África (e de todos os outros continentes).
Israel já teria matado, segundo números do John Mearsheimer (que é um patriota ianque e insuspeito de simpatias russo-chinesas ou islâmicas), mais de 250 mil palestinos em Gaza, o que equivale a mais de 10% da população local.

Isso, naturalmente, abarca todos os métodos de extermínio: dos bombardeios e execuções sumárias até a fome e doenças, graças ao bloqueio imposto ao território bem como aos bombardeios de hospitais e postos de distribuição de alimentos.

Que Israel está cometendo genocídio é indubitável. Que o real objetivo de Israel é o extermínio do maior número de palestinos, com o deslocamento forçado dos que sobrarem, está além de qualquer tipo de questionamento.

Os fatos contemporâneos refutam o mito de que o interesse israelense não passa da busca pela exploração de supostas reservas de hidrocarbonetos no mar próximo a Gaza. Os prejuízos econômicos, sociais e diplomáticos desse conflito para Israel superam em muito a razoabilidade dessa pretensão.

Primeiro porque as reservas em questão são incertas, não apenas quanto a sua quantidade, mas até quanto à confirmação de sua existência. Segundo porque qualquer exploração do tipo levará muitos anos; primeiro seria necessário analisar o local, depois elevadíssimos investimentos para construir a infraestrutura necessária. Os retornos talvez levem mais de 10 anos para até mesmo começar a aparecer, para nem falar em compensação dos prejuízos atuais e futuros.

Os tais protestos nas universidades estadunidenses, que muitos trataram como levante revolucionário, como "começo do fim" pra Israel, como algo que "mudava tudo", não deram em absolutamente nada, como eu previ. Os protestos foram grandes, e a sua repressão expôs a hipocrisia das autoridades estadunidenses, bem como expôs a profundidade do controle sionista - mas não foram protestos populares em nenhum sentido do termo.

Foram protestos de jovens burgueses privilegiados - precisamente os mesmos jovens burgueses que, no resto do ano, estão engajados com atacar os valores das maiorias populares nos EUA. Esses protestos foram vistos com indiferença pela maior parte da população dos EUA, em muitos casos com irritação e incômodo. O fato de que os organizadores dessas manifestações decidiram misturar os eventos com shows de drag queen só piorou tudo.

Naturalmente, os protestos afundaram ainda mais na irrelevância a partir do momento em que a prioridade passou ser a de caçar e expulsar "infiltrados", ou seja, todos aqueles que se faziam presentes para apoiar a Palestina mas não eram da esquerda liberal-progressista. Isso inclui os apoiadores do Hamas, já que além dos vínculos com ONGs liberal-progressistas, alguns dos organizadores desses protestos também tinham vínculos com a Autoridade Palestina.

Menos relevantes ainda foram os procedimentos do Tribunal Penal Internacional e da Corte Internacional de Justiça. Nada que esses órgãos produziram teve caráter vinculante. Nenhum Estado foi impelido à ação por qualquer dos procedimentos. Ademais, conseguiu-se até mesmo suspender a tramitação do pedido de emissão de mandados de prisão contra Netanyahu.

Enquanto se lidar com o sionismo de uma perspectiva amadora e ingênua, e não como uma ideologia pseudo-messiânica que anseia pela escravização dos povos do mundo e pelo extermínio total dos insubmissos, nada mudará. A elite sionista, que possui a mentalidade predatória típica dos psicopatas, se aproveitará das fraquezas emocionais e psicológicas, dos outros povos, para seguir avançando com seu projeto globalista.

Para os brancos ocidentais, Israel tem a narrativa do Holocausto. Para os árabes, a sedução do ouro. Para ainda outros povos, a ameaça do início de uma guerra nuclear e da Opção Sansão. Para o movimento pró-Palestina como um todo, a oposição controlada, composta por antifas sorosianos e agentes de Mahmmoud Abbas. O que não faltam são mecanismos para desarmar ou subverter os inimigos.